24 outubro 2024

Aspectos jurídicos dos conflitos com companhias aéreas

 Principais normas e institutos aplicáveis ao tema

Nos últimos anos, o aumento do transporte aéreo e o crescimento do turismo resultaram em um número maior de passageiros enfrentando problemas com agências aéreas, como atrasos, cancelamentos de voos, extravio de bagagens, overbooking e alterações de horários.

Para proteger os direitos dos consumidores nessas situações, o direito brasileiro oferece uma série de institutos e legislações específicas que regulam a relação entre passageiros e companhias aéreas. A seguir, detalhamos os principais marcos legais e institutos aplicáveis ao tema.

1. Código de Defesa do Consumidor (CDC)

Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) é a principal legislação que protege os passageiros enquanto consumidores de serviços aéreos. De acordo com o CDC, as companhias aéreas, na qualidade de fornecedoras de serviços, são responsáveis por assegurar a adequada prestação dos serviços contratados. Vejamos:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Isso significa que qualquer falha na prestação de serviço, como atrasos, cancelamentos de voos ou perda de bagagens, deve ser indenizada conforme os princípios da responsabilidade objetiva.

Além disso, o CDC garante que o consumidor tem direito à informação clara e adequada sobre o serviço prestado, assim como à reparação dos danos materiais e morais decorrentes de problemas durante a viagem aérea. Nos casos em que a empresa aérea descumpre suas obrigações, o passageiro pode recorrer ao Poder Judiciário para buscar ressarcimento.

2. Convenção de Varsóvia e Convenção de Montreal

Para os voos internacionais, a Convenção de Varsóvia (1929) e a Convenção de Montreal (1999) regulamentam a responsabilidade das companhias aéreas. Essas convenções limitam a responsabilidade das empresas aéreas em casos de danos, extravio de bagagens e atrasos, mas também definem os direitos dos passageiros em voos internacionais.

A Convenção de Montreal modernizou e substituiu a Convenção de Varsóvia em muitos aspectos, oferecendo maior proteção ao passageiro no que diz respeito à compensação por danos materiais e morais. Em casos de atraso, cancelamento ou dano à bagagem em voos internacionais, a responsabilidade da companhia aérea segue as diretrizes estabelecidas por essas convenções.

3. Resolução nº 400 da ANAC

A Agencia Nacional de Aviação Civil (ANAC), órgão regulador do transporte aéreo no Brasil, instituiu a Resolução nº 400/2016, que define as condições gerais de transporte aplicáveis a voos domésticos e internacionais. Essa resolução detalha os direitos dos passageiros e os deveres das companhias aéreas, impondo regras sobre reembolso, assistência material em casos de atrasos ou cancelamentos, e transporte de bagagens.

Entre os principais direitos garantidos pela Resolução nº 400, destacam-se:

  • Assistência material: A partir de 1 hora de atraso, a companhia aérea deve fornecer meios de comunicação. Após 2 horas, é obrigatório oferecer alimentação. Com 4 horas de atraso ou mais, o passageiro tem direito a acomodação ou hospedagem, além de transporte até o local de hospedagem.
  • Reembolso e reacomodação: Em caso de cancelamento ou atraso superior a 4 horas, o passageiro pode optar pelo reembolso integral ou reacomodação em outro voo.

4. Responsabilidade Civil

A responsabilidade civil também é um instituto importante no tratamento de litígios envolvendo agências aéreas. Segundo o artigo 927 do Código Civil, aquele que causar dano a outrem é obrigado a repará-lo. A responsabilidade civil pode ser aplicada em casos de atrasos excessivos, overbooking, perda de bagagem ou falhas graves que causem transtornos significativos aos passageiros.

De acordo com o princípio da responsabilidade objetiva, presente no Código de Defesa do Consumidor, as companhias aéreas respondem independentemente de culpa por eventuais danos causados aos passageiros, exceto em situações de força maior ou culpa exclusiva do consumidor.

5. Juizados Especiais

Dado o grande volume de litígios envolvendo consumidores e companhias aéreas, os Juizados Especiais Cíveis têm sido uma via eficaz para a resolução de disputas. Esses tribunais permitem ao passageiro buscar reparação para prejuízos de até 40 salários mínimos.

Além da rapidez processual, os Juizados Especiais são conhecidos por sua informalidade e simplicidade, o que facilita o acesso do passageiro ao Judiciário para a resolução de conflitos de menor complexidade.

6. Danos Morais e Materiais

Quando uma companhia aérea falha em prestar adequadamente o serviço contratado, o passageiro pode pleitear, além dos danos materiais (reembolso por despesas com alimentação, transporte e hospedagem), danos morais. O dano moral - em síntese - é configurado em situações de extremo desconforto, como o cancelamento abrupto de um voo ou a perda de uma conexão importante, que possam gerar angústia ou sofrimento emocional ao passageiro.

Conclusão

O direito brasileiro, por meio do CDC, das convenções internacionais, da Resolução nº 400 da ANAC e dos institutos de responsabilidade civil, oferece proteção robusta ao passageiro que enfrenta problemas com companhias aéreas. No entanto, é fundamental que os consumidores estejam cientes de seus direitos e saibam como exercê-los, seja buscando acordos diretamente com as empresas, seja recorrendo ao Judiciário. Dessa forma, é possível assegurar que eventuais falhas no serviço sejam devidamente compensadas.

Se você estiver enfrentando problemas relacionados a esse tema, não hesite em buscar o apoio de um advogado de sua confiança para obter orientação profissional.

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  1. BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 12 set. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm. Acesso em: 7 out. 2024.
  2. ANAC. Resolução nº 400, de 13 de dezembro de 2016. Estabelece as condições gerais de transporte aplicáveis ao transporte aéreo de passageiros em voos domésticos e internacionais. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 14 dez. 2016. Disponível em: https://www.gov.br/anac/pt-br/assuntos/passageiros/direitosedeveres/resolucaon400. Acesso em: 7 out. 2024.
  3. CONVENÇÃO DE VARSÓVIA, 1929. Convenção para a unificação de certas regras relativas ao transporte aéreo internacional. Disponível em: https://www.icao.int/secretariat/legal/List%20of%20Parties/Warsaw_EN.pdf. Acesso em: 7 out. 2024.
  4. CONVENÇÃO DE MONTREAL, 1999. Convenção para a unificação de certas regras relativas ao transporte aéreo internacional. Disponível em: https://www.iata.org/contentassets/172504d37b394a2da42a3b38dbbb1dc3/mc99-full-text.pdf. Acesso em: 7 out. 2024.
  5. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 7 out. 2024.